quarta-feira, 29 de abril de 2009

AngolaS2E1

Já estou de volta a Angola depois de 17 dias de merecidas e revigorantes férias, que me deixaram bem mais disposto para encarar outra temporada de três meses por aqui, mesmo com todos os problemas que enfrentamos. O primeiro desses problemas, claro, se chama TAAG. Três horas de atraso para embarque no Galeão, uma corrente de ar em cima da minha poltrona, e pior, uma insistente goteira. Aparentemente, estava chovendo sobre as nuvens. Diante da minha queixa, a aeromoça (bondade minha) disse que não se preocupasse, que depois parava de pingar. Parou no meio de voo e voltou quando estávamos aterrissando.

Aterrissagem que deu susto, aliás. O piloto deve ter pousado com uma inclinação, que sentimos um dos lados tocar o chão primeiro: luzes apagam por um segundo com a operação brusca e vários bagageiros se abrem, vomitando compras de freeshop de brasileiros e angolanos (mais brasileiros, bem mais). Esse avião que me trouxe até Luanda, há pouco mais de um mês, teve de fazer um pouso de emergência após uma turbina pegar fogo.

Enfim, nada demais - apenas o tipo de besteira de que nós exilados gostamos de reclamar, mesmo conscientes das causas do atraso geral dessa terra. Não escute nossas chatices: Angola é legal, impressão que me veio hoje bem forte ao sair do aeroporto e rever essa semi-Feira de Santana gigantesca, cosmopolita e engraçada. Cidade viva.

sábado, 11 de abril de 2009

Fim da primeira temporada

Bom, com este post encerro a primeira temporada desse blog. Clico em Publicar Postagem e vou arrumar a mala para viajar amanhã de manhã rumo a Salvador e outros lugares. Volto dia 26, se Deus quiser.

Enquanto estou fora, deixo uma relação de links de outros blogs sobre Angola. Já deveria ter arrumado o template disso aqui com blogroll, mas tenho sido negligente, sem contar com a falta de tempo (que também não me permite sair do lugar-comum nos textos).

Enfim, seguem os links então:

Angola em Fotos (flog de um fotógrafo corajoso - a polícia e as pessoas não são muito amigáveis a quem porta câmera por aqui; não sei o nome do dono, não consta no endereço).

Ju Borges (jornalista paulista que viveu aqui uns seis meses e fez um blog bacana. Busque nos arquivos os posts da temporada angolana).

Candongueiro (Blog de João Fellet, jornalista que morou aqui em Angola e está fazendo o trajeto Joanesburgo-Cairo sobre rodas).

Caminhos de Angola (Blog da jornalista Hilcelia Falcão, que não mora mais aqui mas continua escrevendo sobre o país).

Birrada (flog de Ailton Cruz, repórter fotográfico alagoano do Jornal de Economia, veículo cujo site eu edito).

Nos links, outros links sobre Angola, e assim funciona a blogosfera.

TO BE CONTINUED

segunda-feira, 6 de abril de 2009

culturangola

Uma das coisas que mais me frustraram nessa minha primeira temporada em Luanda (que se encerra no próximo domingo e será retomada dia 27) foi não ter aproveitado praticamente nada da vida cultural da cidade. Não que haja opções de sobra, mas, por razões fora do meu controle, acabei desprestigiando as poucas iniciativas na área.

Aqui é preciso procurar a cultura, já que a divulgação é muito ruim e os produtores parecem não ter aprendido a abrir espaço na imprensa. Leio os jornais, de todos os espectros políticos, e encontro mais ou menos as mesmas atrações. Aí de repente eu passo na rua e descubro uma série de peças de teatro em cartaz na Liga Africana, mas que não foram divulgadas em lugar nenhum. Fiquei sabendo de uma ou outra exposição e até de uma mostra de filmes soviéticos bem raros, mas a estrutura da cidade dificulta o movimento, e perdi. Superar essas barreiras é a principal meta para a segunda temporada.

Quanto à música, graças às rádios (principal meio de comunicação do país, diga-se de passagem), consegui conhecer algumas coisas interessantes, mesmo que não tanto o quanto gostaria. A melhor coisa que ouvi aqui foi Ruy Mingas, músico na ativa desde os anos 60 que tem lindas canções cantadas em dialetos locais, principalmente o kimbundu. Sou leigo para falar disso, mas a sonoridade me lembra em tom e paixão os boleros latinos, mas a especificidade do idioma garante que estamos diante de algo reapropriado. Vez ou outra, as canções dele parecem chegar ao cântico, com uma dimensão religiosa que não sei se existe nas letras. Os vídeos do Youtube não batem muito com essa descrição (escutei outras coisas dele bem melhores), mas, mesmo assim, tentem chegar a uma conclusão:



Também direcionado à música tradicional angolana, o Grupo Kituxi, surgido nos anos 70, também continua na estrada, tendo lançado recentemente o disco Kufikissa. Escutei o álbum, e ainda tenho alguma dificuldade em lembrar das canções isoladamente. O disco todo parece mais uma partitura única com variações, como uma trilha de cinema, em vez da separação clara dos discos "ocidentais" - severas aspas essas, aliás. O disco é mais um conceito só do que uma coleção de produtos individuais. Mas, bem bom.

Do lado mais pop da cerca, chama a atenção o divertidíssimo som de Yannick e Afromen, rapper e sua banda que andam estourados por aqui. Logo que cheguei fizeram um show num estádio, e os discos vendem que nem água. Yannick fala de problemas cotidianos de Angola e traz o rap para especificações locais, criando grande poder de identificação. Não é só música-denúncia, graças a Deus. Yannick tem um senso de humor incrível, digno dos papas do gênero em qualquer lugar do mundo. Estranhamente, todos os vídeos dele não estão mais disponíveis no YouTube.

Numa levada mais romântica e r&b, Anselmo Ralph aposta em canções jograis, dialogadas, cheias de personagens. A melhor de todas é a seguinte, O Papá Voltará, em que um pai tenta convencer a filha pequena a fazer a cabeça da mãe para o aceitar de volta. Tocou muito aqui no dia dos pais, que aqui não é comemorado em agosto, mas no dia de São José.



O mais popular e respeitado dos artistas angolanos, no entanto, é Paulo Flores, cantor que mistura a música tradicional angolana com influências de "bardos" americanos como Paul Simon ou Bruce Springsteen. O som pode passar distante, mas a vontade de fazer letras politizadas e uma sensibilidade contemporânea fazem com que Flores ocupe a mesma posição que os artistas ocuparam nos Estados Unidos. No Brasil, ele seria um Herbert Vianna: antenado mas não exatamente combativo, e inequivocadamente moderno, sem ser revolucionário.

Flores foi o único artista angolano que vi ao vivo, num pocket show bem intimista no Elinga Teatro. O cantor deixou todo mundo sentar no chão do palco, numa apresentação bem informal. Fiquei logo em frente, sentado, enquanto ele tocava menos de dez músicas. A plateia local cantou todas as canções junto, emocionada. Uma amostra do som de Flores, com Morelembaum fazendo uma ponta e Caymmi lembrado:



Música angolana para download: http://musicadeangola.blogspot.com/