segunda-feira, 4 de maio de 2009

É feitiço

O assunto do dia entre os angolanos é o caso de um rapaz de 20 anos que estuprou a própria mãe, de 60. Não ouvi o noticiário na rádio - que ainda é o principal meio de informação no país - mas todos os locais por perto estão convencidos de que se trata de mais um caso de "feitiço".

Quando as coisas são absurdas demais, sempre há uma explicação esotérica. Nessa ocorrência em particular, o consenso é de que o jovem teria sido incitado por um curandeiro, a quem deve ter procurado em busca de uma solução rápida para ficar rico. Em casos de pacto, os feiticeiros sempre pedem uma ação violenta contra um membro da família, e aí sobrou pra mãe do rapaz ambicioso.

Essa ideia de "feitiço" é assustadora e amplamente difundida por aqui, mesmo entre as pessoas de melhor formação. No geral, a população teme com o diabo à cruz qualquer menção às religiões africanas. Falei sobre as estátuas dos orixás do Dique do Tororó ao motorista e às secretárias da primeira casa em que morei, e todos ficaram incomodados.

Eles não apenas não têm a menor ideia de quem são Oxalá, Iansã ou Ogum, mas mostram repúdio imediato à simples menção de tais entidades. Pudera: são todos frequentadores da Igreja Universal do Reino de Deus, que cresce por aqui em ritmo de galope, com a ajuda da Record Internacional exibida em rede aberta.

Até hoje não conheci nenhum angolano que pratique ou admita ser praticante de qualquer religião africana, tanto que, na minha ignorância, nem sei mesmo se os orixás famosos na Bahia têm alguma correspondência com os deuses daqui. Por enquanto, só tenho visto monoteísmo católico e protestante.

Os indistintos "feiticeiros" só aparecem no jornal e na boca do povo associados a notícias desse tipo, como vilões cruéis, ou então no lugar de dissidentes expurgados - já li mais de uma vez notícias sobre pessoas mortas apedrejadas pelos vizinhos, acusadas de feitiçaria.

3 comentários:

  1. Saymon, a história do candomblé é bem mais complexa. O que praticamos no Brasil é uma religião de matriz africana, que veio para cá há quase 500 anos, através de pessoas escravizadas, que antes de embarcar no porto de Luanda, eram obrigadas a dar três voltas em torno da árvore do esquecimento. Nem todos os africanos vinham de Angola, muitos eram da Costa do Marfim, Nigéria. O que resta de cultura iorubá ou nagô, está aqui na Bahia, na memória de Stella de Oxóssi ou de mãe Tatá da Casa Branca, talvez, quando elas morrerem só restem registros em livros que ninguém mais lê. Os africanos na Nigéria atual são maioria muçulmanos, por exemplo. Os deuses africanos que são cultuados aqui vieram daí, mas não fizeram o caminho de retorno. Quem quer conhecer cultura afro autêntica vem pra Bahia, os negros norte-americanos fazem turismo étnico aqui. Seria bom vc ler Verger, Ruth Landes, Edson Carneiro e tanto outros estudiosos de origem do Candomblé, mas não espere encontrar yemanjá numa esquina da Luanda de agora, essa Luanda que vc comparou com Feira de Santana e que viveu mais de 35 anos de guerra civil, nenhum deus sobrevive a uma guerra.

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  2. pra concluir, as promessas de paraíso e riqueza da igreja universal, pq eles prometem realização nesta vida e não na outra como a igreja católica, seduzem bem mais os angolanos pobres do que os deuses antigos.

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  3. a feitiçaria é praticamente inexistente em angola e se praticada ela é de porveniencia sulista e sempre muito oculta;angola tem uma raiz missionaria catolica apesar de seitas hoje entrarem no país;mas o catolicismo ainda continua a ser a vanguarda e religião angolana( UMA Curiosidade) a peregrinaçao a MUXIMA ou NOSSA Sra da MUXIMA ainda é mais antiga que qualquer outra peregrinaçao como FATIMA ou mesmo nossa sra da aparecida no brasil

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